As crianças são exemplos claros de como vamos descobrindo regras na medida em que desobedecemos alguma. “Não pode subir na mesa! Não pode desenhar na parede!” Regras, normas, convenções, códigos de conduta… De forma direta e, principalmente, indireta os adultos vão mostrando como habitar o mundo, como viver em sociedade.
Mas essa não é uma reflexão sobre idade, é sobre estarmos há mais ou menos tempo praticando e pactuando com as regras de um determinado lugar.
Os mais experientes – como de costume e para manter o costume – apresentam o jeito como as coisas funcionam para os recém-chegados. Acontece com um funcionário novo, acontece com uma criança na escola nova, acontece com alguém vai morar em outro país…
Somos introduzidos ao modo como as coisas funcionam e concordamos com maior ou menor facilidade e satisfação em seguir a tradição. Assentimos, seguimos e assim vivemos bem.
Porém, embora o funcionário leia sobre a cultura da empresa, embora a criança seja apresentada às regras da escola, embora o imigrante ouça e pesquise sobre a vida neste novo país, tem sempre algo que você simplesmente ainda não sabia. Algo muito bem amarrado, convencionado e sutil.
Se é no mais evidente que o recém-chegado desobedece, é na brecha da brecha da profundeza do implícito mal-dito que o mais experiente infringe. Ao internalizar regras implícitas por cima de regras implícitas, já não precisa dizer nada e presume, sobre o outro e com o outro, que concordam. Isto vai bem até que uma das partes sinta-se lesada pelo não cumprimento do acordo tácito que se estabeleceu ali. É neste momento, em sobressalto, que um deles pode dizer: Mas onde isso está escrito? Mas ninguém nunca disse que… Mas eu nunca concordei com isso! Nós nunca combinamos que seria assim.
Na empresa, na escola, nas ruas… basta que haja dois, cada um representando um tanto, uma infinidade de normas explícitas e implícitas que moldam nosso jeito de ser e de nos relacionar. Quando estes mundos, até então alinhados, se chocam, surge uma oportunidade de conversa, de rearranjo, de novo contrato. E é também por isso que, pelos passos de um recém-chegado, ou pelo estranhamento que ele provoca, que instituídos vão sendo revistos e o mundo muda apesar de sua repetição.